A escassez de médicos especialistas em municípios do interior é uma das principais reclamações de gestores de unidades de saúde. A diretora do Hospital Pedro Vasconcelos, em Miguel Alves (PI), Luciana Madeira, diz que faltam principalmente ortopedistas no município.
Com cerca de 32 mil habitantes, a maioria na área rural e pouca infraestrutura urbana, muitos moradores de Miguel Alves recorrem a motocicletas para se locomover, em geral sem usar capacete ou qualquer outro equipamento de segurança.
O resultado, conforme destacou a diretora da unidade, é um alto número de pacientes que dão entrada na emergência por causa de acidentes de trânsito. Nos fins de semana, a situação costuma ser mais grave, quando chegam a ser atendidos até 15 acidentados.
“O clínico atende, solicita raio X, que funciona 24 horas mas é antigo e, em 80% dos casos, encaminha para a capital, Teresina, a 100 quilômetros de distância”, disse Luciana. A diretora enfatizou que a presença do ortopedista não resolveria todos os casos porque o hospital, de pequeno porte, não teria capacidade para fazer cirurgias complexas que dependem de equipamentos de custo elevado, como tomógrafos e ressonância magnética.
Ela argumenta, no entanto, que os especialistas na área ajudariam a tratar os casos menos graves e a fazer um diagnóstico mais preciso. Na unidade hospitalar, o centro cirúrgico está desativado por falta de equipamentos e de profissionais.
Outra especialidade que, segundo Luciana, faz falta no município é dermatologia. Mesmo sem saber precisar quantos casos são registrados a cada mês, ela enfatizou que são comuns os de calazar (leishmaniose visceral). A doença é transmitida pelo mosquito-palha ou birigui - Lutzomyia longipalpis - que, ao picar, introduz na circulação do hospedeiro o protozoário Leishmania chagasi. A doença causa lesões na pele e a transmissão, em geral, é feita do cachorro já infectado para o homem.
A diretora da unidade de saúde também informou que no hospital do município a sala de ultrassom fica ociosa a maior parte do tempo, funcionando apenas uma semana vez por semana, no único dia que o médico responsável pelo exame vai à cidade. Ela acrescentou que para dar conta da demanda, o especialista faz, em média, 80 exames às sextas-feiras. Os atendimentos começam às 15h. Uma hora antes, em média, 50 pacientes já aguardam na recepção do hospital.
A dona de casa Francisca Lima da Silva, 65 anos, moradora de Miguel Alves, prefere chegar cedo para não correr o risco de perder o exame. “Acho ruim, mas tem que enfrentar”, disse à Agência Brasil.
Moradora da área rural do município, a 30 minutos do centro urbano, a lavradora Francilene de Souza, 33 anos, também aguardava para fazer o exame no filho, de 4 anos, bem antes do início dos atendimentos. Com febre e apresentando barriga inchada, a médica do Programa Saúde da Família que a atendeu, suspeitava de infecção intestinal.
“Ele só vive com a barriga fofa, dando febre e a médica passou esse exame no mês passado. Marquei para fazer hoje porque é caso de urgência”, disse Francilene.
Na avaliação da prefeita de Miguel Alves, Salete Rego, a dificuldade de fixar médicos, especialistas e generalistas, está associada ao fato de o município ter 68% da população vivendo na zona rural. "Quem é urbano, dificilmente quer viver em um ambiente rural", disse.
Ela informou que o município aderiu ao Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab), que estimula a formação de médicos para atender populações em locais carentes, e ao Mais Médicos, mas acredita que somente essas medidas não serão suficientes para resolver os problemas na saúde local. Ela defende maiores repasses de recursos para financiar a saúde do município.
"Temos que equipar postos de saúde para que o médico tenha melhores condições para trabalhar. O município não tem estrutura financeira para manter a saúde", disse a prefeita.
Situado ao norte do Piauí, o município de Miguel Alves ocupa a 5.332ª posição entre os 5.565 municípios do Brasil no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), divulgado há duas semanas pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). De acordo com a pesquisa, a mortalidade infantil - de crianças com menos de 1 ano - em Miguel Alves caiu 45%, passando de 54,4 por mil nascidos vivos em 2000 para 29,4 por mil nascidos vivos em 2010.
O patamar, no entanto, ainda está bem acima do previsto nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas, que estabelece que a mortalidade infantil para o Brasil deve estar abaixo de 17,9 óbitos por mil em 2015. Em 2010, as taxas de mortalidade infantil do estado do Piauí e do país eram 23,1 e 16,7 por mil nascidos vivos, respectivamente.
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