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Quarta-feira, 25 de dezembro de 2024
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Cultura

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cantidiosfilho@gmail.com

13/12/2024 - 09h39

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13/12/2024 - 09h39

A Primeira Camisa

 

“Se você me pegar cem piabas, te dou uma camisa”.

 “Se você me pegar cem piabas, te dou uma camisa”.

Seu Pojucã tinha nome de índio, nariz de árabe e um punhado de filhas bonitas. Não sei exatamente o que fazia para ganhar a vida. Sei que morava no bairro Aldeia, próximo à capelinha. Diariamente, ao meio-dia, antes do almoço, passava na quitandinha de dona Purcina para uma talagada de Claudionor Carneiro. Como tira-gosto, piaba frita. Cabia a mim providenciar as piabas. Numa manhã qualquer, por razões que não me lembro, não fui pescar. Seu Pojucã não se conteve: “Não foi pescar por quê, menino?”. Mesmo correndo o risco de pegar uma boa sova de dona Purcina, respondi de bate-pronto: porque não quis. O cidadão sorriu e propôs: “Se você me pegar cem piabas, te dou uma camisa”. Sem pestanejar, aceitei a proposta. Na manhã seguinte, antes de o sol nascer, eu já estava na beira do açude. Por volta das oito horas, 102 piabas estavam na lata. Com a ajuda da Bia, limpei-as, tratei-as e coloquei-as numa folha de flandres para secar.

Ao meio-dia, entreguei-as ao contratante.  O narigudo, com ar de incredulidade, desconversou: “O que vou fazer com tantas piabas, menino?”. Não fiz concessões: aqui estão as piabas; quero minha camisa. Homem de bem, o cidadão me deu um dinheirinho e, delicadamente, bateu na minha cabeça: “Você vai longe, garoto”.  Corri até a loja de seu Abdon, comprei um pedaço de tecido – branco com listras azuis – e entreguei a dona Purcina. Dois dias depois, vesti a primeira camisa que comprei. Para mim, dupla alegria: vestir uma camisa nova e saber que, com o meu trabalho, eu poderia comprar outras. Assim tem sido.
                
(fragmento de O aldeão Lírico)

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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais. 

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