É mais fácil encontrar gente poderosa defendendo limitar o orçamento para creches, escolas e hospitais públicos e desvincular do salário mínimo pensões, aposentadorias e BPC dos pobres do que achar quem empunhe a bandeira de taxar decentemente os super-ricos. Não surpreende, apenas preocupa pela possibilidade de faltar óleo de peroba no Brasil.
Lula prometeu na campanha que iria colocar os super-ricos no Imposto de Renda, mas está longe de cumprir isso. A pauta foi levada à conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT) pelo ministro Luiz Marinho, nessa quarta, 12 de junho, como informa Jamil Chade, no UOL, e vem sendo defendida pelo ministro Fernando Haddad em fóruns internacionais, como o G20.
O problema é convencer aqui dentro sobre o assunto. Pois é mais simples o tal camelo passar pelo buraco da tal agulha do que esse Congresso aprovar um Imposto de Renda realmente progressivo e taxação de grandes fortunas. A discussão dos impostos sobre rendimentos (segunda etapa da Reforma Tributária) é tema tão difícil de ser encontrado nos corredores do parlamento como cabeça de bacalhau ou filhote de pombo.
Pressionado para garantir paz com os donos e operadores do dinheiro grosso (lembrando que o governo Bolsonaro pedalava com precatórios e ainda assim ganhava sorrisos apaixonados da Faria Lima), o Ministério da Fazenda estuda propostas para as regras orçamentárias de educação e saúde, reduzindo seu aumento anual para adequa-las ao arcabouço fiscal, tal como para os benefícios de seguridade social - desvinculando alguns deles do salário mínimo e, portanto, de seu aumento real anual.
Traduzindo: menos dinheiro para papel higiênico para a criançada na creche, para gaze e aspirina no posto de saúde e para os idosos e doentes se equilibrarem.
Claro que tirar dos muito, muito ricos não vai resolver as questões fiscais do país. Mas é muita sacanagem, para usar uma expressão leve, que o debate da saúde financeira do país gire em torno de subtrair cascalho usado para garantir um mínimo de dignidade a quem tem menos enquanto ignora-se a discussão sobre taxar os que mais têm.
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Leonardo Sakamoto, Jornalista, cientista político, professor da PUC-SP, diretor da Repórter Brasil, comentarista do Jornal da Cultura, colunista do UOL Noticias - nas redes sociais.
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