Paulista por contingência; piauiense por opção, Alberto da Costa e Silva foi o cidadão mais culto e mais civilizado que conheci. Um exemplo de civilidade: certa feita, veio a Teresina para a reinauguração de uma praça que leva o nome do seu pai, Da Costa e Silva. A solenidade estava marcada para as 17 horas. O então prefeito chegou por volta da 20, levemente embriagado. Estava na festa de inauguração de uma concessionária de automóveis. Todos os convidados haviam se retirado, menos Alberto, Paulo Nunes e eu. O prefeito tentou engendrar uma desculpa, Alberto antecipou-se: “Senhor prefeito, governar é, acima de tudo, eleger prioridades”. E o abraçou cordialmente.
Senhor de uma erudição extraordinária, não se jactava disso: tinha a serenidade dos verdadeiros sábios. Falava baixo para educar o ouvido dos interlocutores. Embaixador, poeta, historiador e ensaísta, lamentava não ter aprendido árabe para ter compreendido melhor a África, que tanto amava. Designado para servir em Laos, mergulhou fundo na história e na cultura africana de onde extraiu livros essenciais (A enxada e a lança; A manilha e o libambo; Um rio chamado Atlântico , entre outros) para a compreensão do continente africano. Alberto era um dos mais respeitados africanistas do ocidente.
Excelente poeta, fazia questão de esconder-se para não fazer sombra à figura do pai de cuja memória cuidava com dedicação e zelo. Não por acaso, no sintético poema “Murmúrio”, escreveu: “Vou pedir a meu pai/ para que me esqueça menino”.
O dia 26 /11/23 será lembrado como um dia triste. O Brasil perdeu um dos intelectuais mais brilhantes de sua história; a ABL, cada vez mais recheada de celebridades, perdeu o seu último erudito. Quanto a mim, perdi um grande amigo.
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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.
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