Indiferente aos horrores da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), da qual  não tivera notícias, seu Liberato decidiu abandonar o povoado São Braz onde nascera em 1903. Queria um lugar sossegado para trabalhar, longe de tudo.A decisão se fez concreta no final de 1945. Montado num velho pangaré, viajou o dia inteiro até o local no qual decidira fixar-se. O lugar era um convite a não ficar: áspera chapada, infestada de cupinzeiros e moitas de alho-bravo. Como havia um baixio em que, no período das chuvas, juntava alguma água, batizaram a gleba com o nome de Lagoa dos Tubis. Tudo o que existia no local  eram as ruínas de uma casa velha e um curral destroçado. Seu Liberato olhou, conferiu e decidiu que ali fincaria mourões, plantaria filhos e irrigaria a terra seca com o suor do próprio corpo. A gleba tinha o tamanho das suas aspirações.
            
Ao visitar o lugar, dona Purcina não ficou satisfeita com o que viu. Decidiu que a medida mais urgente seria mudar o nome da propriedade, já que a palavra tubi tanto servia para nomear uma abelha de mel travoso como para designar ânus.  Crente no poder transformador da palavra, rebatizou aquele pedaço de chão inclemente com o nome poético Campo Formoso. Situado num ponto equidistante entre o nunca e o nada, a propriedade dos meus pais estava encravada no sertão do município de Caracol.
            
Em pouco mais de dois anos, o lugar já se tornara habitável, com casa refeita, curral novo, duas roças e um barreiro para armazenar a água das chuvas. Foi justamente naquela casa remendada (metade taipa; metade adobe) que, numa esplendente manhã de setembro de 1948, Nhá Maria apresentou-me ao mundo. Sem maiores exigências, fui me afeiçoando à vida e aqui estou.A poeta tem razão: “Viver/vicia”.

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Cineas Santos é professor, escritor, poeta e produtor cultural - nas redes sociais.