Com medidas mais rígidas e uma comunicação mais forte do que em outras regiões, o Nordeste registra hoje a menor taxa de mortalidade pela covid-19. Em 2021, por exemplo, essa taxa está em 49 por 100 mil habitantes, 37% menor do que a média nacional no mesmo período, que chega a 78 por 100 mil habitantes. No Sul, líder no índice, o número chega a 109 por 100 mil.
“O Nordeste hoje é quem puxa hoje a mortalidade do Brasil para baixo”, diz André Longo, secretário de Saúde de Pernambuco e vice-presidente do Nordeste do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde).
A taxa de mortalidade do Nordeste na pandemia era de 134 por 100 mil na última quinta-feira (15). Os três estados com menores taxas de mortalidade na data eram do Nordeste: Maranhão (95 para cada 100 mil), Bahia (114) e Alagoas (117). A média nacional na data ficava em 174 para cada 100 mil pessoas.
Desde o início da pandemia, segundo os números oficiais do Ministério da Saúde, a região registrou até a quinta-feira 76 mil dos 365 mil óbitos —o equivalente a 21%.
Longo afirma que o resultado se deve, em partes, porque a região se articulou desde o início e ouviu mais a ciência. Mas ele reconhece que, mesmo com uma situação melhor que outras regiões, o cenário é crítico no Nordeste.
A gente não comemora esses números. Mas precisamos reconhecer o esforço dos profissionais de saúde e dos governadores, que tiveram coragem de adotar medidas restritivas –que nem sempre têm uma repercussão positiva na população, mas precisavam ser adotadas. Além disso, ampliamos muito a capacidade hospitalar. Só aqui foram 540 leitos de UTI em 40 dias.
Quatro dos nove estados têm mais de 90% de ocupação de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva).
Para a infectologista Ana Brito, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) de Pernambuco, ainda é cedo para ter certeza de que os números se manterão tão abaixo da média nacional por conta do incerto pico da segunda onda da pandemia.
“Olhando para Manaus, a gente vê que teve um período de 45 dias até a explosão da epidemia. Mas pode ser que a gente já esteja entrando nesse tempo, mas é uma especulação. É preciso aguardar mais.
“Indiscutivelmente as medidas de restrição de circulação da população causam uma diminuição dos casos. O problema do Brasil é que a gente não fez medida restritiva de forma rigorosa. A gente aqui fez medidas parciais, mas, mesmo parciais, há uma resposta, embora mais tímida”, completa.
Referência no país
Salvador e Fortaleza, duas das cidades mais populosas da região, foram citadas como referência em medidas de restrição à circulação bem-sucedidas no último boletim da Fiocruz.
“Tendo como referência os decretos nacionais que estabelecem as atividades e serviços essenciais, bem como decretos municipais mais recentes de Fortaleza, Salvador e Araraquara (SP), cidades que se submeteram a restrições mais rígidas e que apresentaram decréscimo sustentado dos indicadores de criticidade da pandemia, apresentamos no alguns exemplos de atividades e serviços essenciais e não essenciais”, diz documento da entidade.
Fortaleza decretou o fechamento dos serviços não essenciais em 5 de março, flexibilizando apenas questões pontuais até aqui. Já na Bahia, primeiramente houve fechamento de serviços não essenciais no último fim de semana de fevereiro, mas depois a medida foi esticada para todos os dias da semana em março.
Nos demais estados, todos adotaram algumas medidas restritivas, como toque de recolher, suspensão de eventos, fechamento de bares e restaurantes e restrição de horários de atividades não essenciais.
A revista científica The Lancet afirmou ainda que o Nordeste é o melhor exemplo de medidas restritivas com sucesso no país, mesmo sendo uma área com grande vulnerabilidade social.
A médica e pesquisadora Fernanda Grassi, da Fiocruz da Bahia, ressalta que o resultado do Nordeste chama ainda mais a atenção porque a região tem uma disponibilidade de leitos de UTI menor que Sul e Sudeste.
Essa menor mortalidade deve estar relacionada à postura adotada pelos governos, que desde muito cedo criaram um comitê científico com pessoas de grande experiência no controle de epidemias. Houve, sem dúvida, uma maior busca de seguir a OMS (Organização Mundial da Saúde) para mitigar essa epidemia, com campanhas educativas”, destaca.
O epidemiologista Antônio Lima Neto, da Unifor (Universidade de Fortaleza), afirma que, como a epidemia ainda está em curso, não há como cravar que a região não verá um crescimento de casos e óbitos. Entretanto, com as medidas já adotadas, a região deve ter uma redução na transmissibilidade do novo coronavírus.
“O impacto das medidas restritivas para uma epidemia é um pouco mais tardia, demora mais a acontecer”, afirma.
Nordeste errou menos
O neurocientista Miguel Nicolelis chegou a coordenar o comitê científico do Nordeste em 2020 e início de 2021. Ele deixou o cargo em fevereiro , após o aumento de casos. À época, os governos estaduais não seguiram orientações dos especialistas para fechamento de serviços não essenciais.
“Diria que os governos cometeram erros, mas o Nordeste errou bem menos”, diz. “É como uma turma em que ninguém passou de ano, mas os governos nordestinos tiveram a melhor nota da sala”, compara.
Para Nicolelis, a região colhe ainda bons frutos das medidas adotadas na primeira onda.
A mensagem passada da gravidade da pandemia foi bem maior, os governos alertaram mais, o que não ocorreu de forma tão explícita em nível nacional. Sem dúvida foi a região menos negacionista do país.
O pesquisador ainda lembra que, na primeira onda, os governos seguiram mais as recomendações científicas e colheram frutos disso. “Tivemos lockdowns bem sucedidos, começando por São Luís, depois Fortaleza, a Grande Recife e João Pessoa. Os resultados foram bons. Em São Luís, por exemplo, os efeitos positivos foram sentidos por quatro meses e levaram o Maranhão a ter menor taxa de óbito do país”, cita, lembrando medidas como modelo para o país.
“Ações como a criação de brigadas de saúde no Piauí e a suspensão do transporte intermunicipal na Bahia foram boas, tiveram grande impacto e reduziram o poder letal da pandemia”, diz.
Mortalidade por 100 mil habitantes por região em toda a pandemia
- Nordeste – 134
- Sul – 184
- Sudeste – 186
- Norte – 191
- Centro-Oeste – 210
Mortalidade por 100 mil habitantes por região em 2021:
- Nordeste – 49
- Sudeste – 81
- Norte – 91
- Centro-Oeste – 96
- Sul – 107
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Fonte: Ministério da Saúde até dia o 15/04/2021
Do UOL
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